“Abril, águas mil”.
Na sua ligação umbilical à Mãe-Natureza, o provérbio ergueu-se. Este ano, cumpriu-se o aforismo. E a Mãe-Natureza curva-se, grata. A Primavera é metamorfose. A Revolução dos Cravos virou do avesso um país anacrónico, tardiamente imperialista, conservador e machista, e projetou-o para a modernidade, sendo lento a expurgar moléstias ancestrais.

O Agrupamento de Escolas Nuno de Santa Maria, o Projeto
+ Humanidade (do Departamento de Ciências Sociais e Humanas), o Projeto
Artes + (do Departamento de Expressões), a
Biblioteca Escolar, alunos e professores, de há anos para cá, conjugam-se no sentido de dar a maior importância à valorização dos direitos fundamentais que Abril fez germinar, à liberdade e à democracia. Fazem-no há anos. Ainda em tempos em que mal se vislumbravam, no horizonte, movimentos e líderes populistas e demagógicos, que torpedeiam valores fundamentais, conquistados com sangue, suar e lágrimas.
Na celebração deste acontecimento tão marcante da nossa história recente, no âmbito da cidadania e da valorização de regime democrático, foram realizadas as seguintes atividades:
- Visita de estudo ao Museu Nacional da Resistência e Liberdade (Forte de Peniche, prisão política do Estado Novo, durante décadas, onde 1661 opositores da ditadura salazarista passaram uma parte das suas vidas…um deles, vinte e um anos), para as turmas do 9.º ano de escolaridade;
- Exposição de cartazes, elaborados pelo 12.º A, na aplicação canva, em grande formato, no Polivalente, com o título “Ousaram: Não Temeram, Não Tremeram”, homenagem a um conjunto de 25 mulheres, opositoras ao Estado Novo e às quase duas mil que foram presas, impiedosamente torturadas e, algumas, mortas pela PIDE e pela GNR, durante os quarenta e oito anos de ditadura em Portugal, a mais longa da Europa;
- Exposição de desenhos, elaborados pelo 12.º ano, Turma C, nas disciplinas de Desenho A e Artes Visuais, de cunho neorrealista, inspirados na obra pictórica do dirigente político e opositor ao Estado Novo, Álvaro Cunhal, no Polivalente da ESSMO. A turma utilizou elementos morfológicos da imagem, bem como elementos estruturantes da linguagem plástica. Selecionou como modos de registo: traço, mancha e técnica mista, evidenciando um crescente domínio técnico e intencionalidade expressiva nos trabalhos que realiza. Em paralelo, manifestou um progressivo domínio na aplicação dos conceitos e dos elementos estruturais da linguagem plástica: forma (plano, superfície, textura, estrutura); cor/luz; espaço e volume (profundidade e sugestão da tridimensionalidade); movimento e tempo, escala, ritmo, equilíbrio e estrutura, entre outros; aplicando-os na elaboração de desenhos e de imagens expostas.

- Visita de estudo ao Museu do Neorrealismo (Vila Franca de Xira) e ao Museu Nacional da Resistência e da Liberdade (Peniche), para as turmas A e B, do 12.º ano, de História A.
- Exposição, na Biblioteca da ESSMO, de poemas e livros e frases associados à efeméride.
- Palestra, na Biblioteca Municipal, sob o lema “25 de Abril - Um Tempo Novo para as Mulheres”, com a Bastonária da Ordem dos Advogados, Dr.ª Fernanda de Almeida Pinheiro; a Representante da Ordem na Região Centro, Dr.ª Teresa Letras e a Representante concelhia da Ordem, Dr.ª Fátima Duro. A atividade foi dirigida às turmas do 12.º ano e às turmas A e D, do 9.º ano.
Nota: Esta palestra estava agendada para o dia 29 de abril. O “apagão”, ocorrido no dia anterior, impossibilitou a sua realização na data prevista. As palestrantes, apesar da sua carregada agenda de trabalho, fizeram questão em vir na semana seguinte, a 6 de maio.
A palestra foi presidida pela Diretora do Agrupamento, Dr.ª Celeste de Sousa, que realçou a importância do evento e o seu amplo significado no âmbito do conhecimento e da cidadania. Terminou com um agradecimento às palestrantes, que vieram de longe para partilharem o seu conhecimento e testemunho.
Seguidamente, a Dr.ª Angelina Oliveira, em nome do Projeto + Humanidade, referiu que
“na longa travessia do tempo pelos nossos antepassados, a Humanidade e a desumanidade caminharam lado a lado. A parte solar dos nossos antepassados criou a Arte, a Filosofia, a Matemática, o Teatro, a Escola, a Música, os Jogos Olímpicos …. Aristóteles, Marco Aurélio, Bento de Núrsia, os irmãos Limburg, Leonardo da Vinci, Copérnico, Galileu, mas, também, a escravatura, o imperialismo e a brutalidade que lhe são associadas; a Inquisição e as suas desumanas e impiedosas perseguições; a intolerância religiosa e política; a secular submissão da mulher ao homem; os conflitos e guerras em que a Europa se destaca sobremaneira…”.

Mais adiantou que “O propósito do PROJETO + HUMANIDADE não é falar do passado. O principal objetivo é preparar atividades para a comunidade educativa que façam refletir, pensar e ter opinião, baseada no conhecimento, sobre muitos problemas que vêm do passado e permanecem na sociedade e nos tempos em que vivemos.
Este ano juntamos a comemoração do Dia da Mulher com o 25 de Abril. Demos a esta atividade o nome “25 de Abril – Um mundo novo para as mulheres”. Com a Revolução, a sociedade portuguesa passou por uma profunda transformação e, nunca mais, voltaria a ser a mesma. A “maioria silenciosa”, finalmente, conquistou os direitos fundamentais”.
Depois, deu a palavra à aluna Francisca Marques, do 5.º ano, turma C, da EDNAP, que começou a apresentação da palestra e dos motivos para a sua realização.
“Antes do 25 de Abril havia um país que não era igual para mulheres e homens. Eles mandavam, elas obedeciam. Tinham direitos e vidas tão controladas que nem sequer podiam exercer as profissões que queriam. Quando chegou a liberdade, chegou a promessa da igualdade.
As mulheres ganharam voz e o domínio masculino ficou fortemente abalado. O 25 de abril de 1974 trouxe promessas de igualdade de género. As mulheres passaram a ser livres para fazer as suas escolhas e desafiaram as regras. Tornaram-se governantes, juízas, começaram a conduzir camiões e a trabalhar nas obras. Passaram a estar em maioria na universidade e a contar com direitos sexuais e reprodutivos que lhes deram o poder de decidir as suas vidas. Mas, 50 anos depois da Revolução, a paridade ainda é uma realidade distante. As mulheres continuam a ganhar menos do que os homens pelo mesmo trabalho, estão menos representadas no Parlamento e na administração de grandes empresas e também em profissões ligadas à ciência e à tecnologia. Trabalham mais horas, principalmente nas tarefas domésticas e de prestação de cuidados à família e, são vítimas de violência doméstica….
Apesar das muitas conquistas alcançadas, a luta no feminino continua…
Termino com o conceito de feminismo de Emma Watson: Embaixadora da Boa Vontade da ONU Mulheres:
“O feminismo é “a crença de que homens e mulheres devem ter direitos e oportunidades iguais. É a teoria da igualdade dos sexos nos planos político, económico e social. Esses direitos iguais, considero, como sendo direitos humanos”.
Logo após as palavras de Leonor Lopes e de Maria Clara Segorbe, alunas do 12.º A, na apresentação das palestrantes convidadas.
“Apesar de subalternizadas, pontapeadas e humilhadas, muitas portuguesas ousaram. Não temeram. Não tremeram. Ao longo dos 48 anos de ditadura. É o que mostrámos, e homenageámos, na exposição que lhes dedicámos, patente no Polivalente da ESSMO.
Durante os 48 anos de ditadura, a mais longa da Europa, a mulher portuguesa não se queria inteligente. Apenas, obediente.
Era isso que o Estado Novo exigia e a comunidade masculina queria. O 25 de abril de 1974 acabou com essa dupla opressão: a política e a social/familiar.
É por isso que estamos aqui, hoje. Para comemorar e lembrar o 25 de Abril e o mundo novo que a Revolução dos Cravos trouxe às mulheres portuguesas, tão bem ilustrada no cartaz “A poesia está na rua”, da pintora Maria Helena Vieira da Silva, exilada em Paris, por ser uma opositora da ditadura.
Estamos aqui para lembrar e homenagear as quase duas mil portuguesas que foram presas e torturadas nas prisões políticas da ditadura salazarista, pela PIDE; as que foram mortas e todas as nossas antepassadas que não puderam conhecer a alegria imensa que é viver em liberdade. E serem consideradas iguais.
As palestrantes, advogadas de profissão, que exercem cargos de grande responsabilidade na Ordem, a nível nacional, regional e concelhio, nas suas comunicações realçaram que a Revolução dos Cravos abriu caminho para a igualdade de género e para a emancipação feminina em diversas áreas.
Antes do 25 de Abril, as mulheres em Portugal viviam sob um regime que limitava severamente os seus direitos e as relegava para um papel secundário na sociedade.
No que diz respeito aos direitos políticos, não podiam votar em igualdade de condições com os homens. O sufrágio feminino foi introduzido gradualmente e com restrições, sendo apenas universal e sem restrições após o 25 de Abril de 1974.
Relativamente aos direitos civis, precisavam da autorização do marido para trabalhar, viajar para o estrangeiro, abrir contas bancárias ou praticar atos comerciais; não podiam exercer certas profissões, como a de juíza, diplomata, militar ou polícia; o divórcio era proibido, exceto em casos de adultério comprovado do marido; no casamento, eram consideradas legalmente inferiores ao marido, que era o "chefe de família".
No campo dois direitos laborais: ganhavam salários inferiores aos dos homens para o mesmo trabalho e enfrentavam discriminação no acesso ao emprego.
No direito da família: a autoridade parental era exercida predominantemente pelo pai e nos direitos sexuais e reprodutivos: a informação e o acesso a métodos contracetivos eram limitados e o aborto era ilegal.
Com a Revolução de Abril e a promulgação da Constituição de 1976, foram consagrados diversos direitos fundamentais que impactaram diretamente a vida das mulheres: igualdade perante a lei: O princípio da igualdade entre homens e mulheres foi estabelecido constitucionalmente, pondo fim a muitas das discriminações legais existentes; o direito ao voto: As mulheres passaram a ter o direito de votar e ser eleitas em todas as eleições, em igualdade de condições com os homens; acesso à educação e ao emprego: foram criadas condições para uma maior igualdade de oportunidades na educação e no mercado de trabalho, permitindo que as mulheres acedessem a profissões que antes lhes eram vedadas; as reformas introduzidas no Código Civil, em 1977 e anos seguintes, eliminaram a figura do "chefe de família", estabeleceram a igualdade entre os cônjuges na gestão familiar e no exercício da autoridade parental, e facilitaram o divórcio; direitos sexuais e reprodutivos: embora a legalização do aborto só tenha ocorrido mais tarde (em 2007, através de referendo), a Revolução dos Cravos abriu caminho para a discussão e a defesa dos direitos das mulheres nesta área, com avanços graduais no acesso à contraceção e à saúde sexual; combate à violência doméstica: a consciencialização sobre a violência contra as mulheres aumentou, levando à criação de legislação e de estruturas de apoio às vítimas.

Em suma, o 25 de Abril trouxe “um mundo para as mulheres”, pois representou um marco crucial na história dos direitos das mulheres em Portugal.
A Revolução desmantelou as estruturas legais e sociais que perpetuavam a desigualdade e abriu caminho para a conquista de uma cidadania plena e para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária.
No entanto, apesar dos progressos significativos, a luta pela igualdade de género continua a ser uma realidade em Portugal, com desafios persistentes em áreas como a disparidade salarial (no setor privado) e a representação política e em cargos de liderança.
Na parte final da palestra, os alunos colocaram algumas questões às ilustres palestrantes, criando momentos de interação gratificantes para as partes.
O Projeto + Humanidade, o Projeto Artes +, a Biblioteca Escolar e todos os alunos e professores envolvidos na preparação e execução das atividades proporcionadas à comunidade educativa agradecem o apoio firme e continuado da Direção do Agrupamento.
Um agradecimento, também, à professora Susana Viegas, do Departamento de Expressões, que deu toda a colaboração na formatação dos cartazes, idealizou a estrutura da exposição, colaborou na montagem da mesma e criou o logotipo que a anunciava.