quarta-feira, 7 de setembro de 2022

Tomar a Aprender

A Câmara Municipal de Tomar (CMT) voltou a convidar todos os professores do concelho para uma sessão formativa, cultural e lúdica que marcasse o início do ano letivo. Esta “assembleia magna” de docentes repete-se já há alguns anos, numa iniciativa que se saúda e que começa a “marcar pontos” em Tomar.

Estiveram presentes cerca de 400 docentes (do ensino pré-escolar, básico e secundário), no Cineteatro Paraíso. 

O encontro começou com um apontamento musical protagonizado pela prof.ª Júlia Quadros e pela aluna Margarida Vieira (AENSM), que interpretaram dois temas especialmente relevantes e significativos para o auditório: “Imagine”, de John Lennon e “O Melhor de Mim”, de Mariza. 

Foi depois tempo para o vice-presidente da CMT, Hugo Cristóvão, dirigir algumas palavras aos presentes, dando as boas-vindas a todos os professores recém-chegados ao concelho, desejando um bom ano letivo a todos os docentes que irão trabalhar no concelho em 2022-23 e deixando algumas perspetivas sobre o que irá acontecer, no campo da educação, quer em termos de infraestruturas, quer em termos de recursos humanos.

Três professoras do AET apresentaram o livro “Medos e Sonhos” a ser lançado brevemente.

Subiu então a palco David Erlich, um jovem professor de filosofia (o mais jovem professor de filosofia do Ensino Público em Portugal) que veio partilhar com os presentes algumas ideias que o têm tornado uma referência no ensino da filosofia, em particular, e do ensino, em geral.

Começou o jovem professor por constatar duas evidências:

1) Não há ensino e aprendizagem de qualidade sem professores.

2) No mundo atual, os professores não podem gerir as suas aulas como há 200 anos.

E reafirmou aquilo que já muitos outros andam a dizer há muito tempo: a escola não se deve focar na disponibilização de informação (para isso há as novas tecnologias, muito eficientes e exatas), mas centrar-se na promoção e no desenvolvimento de uma consciência crítica perante os saberes. Dito de outro modo: a escola não é mais o sítio onde está o saber, mas deverá ser o sítio onde os saberes passam a ter significado e relevância. 

Nesta linha, David Erlich apresentou 8 práticas pedagógicas para que as aprendizagens sejam significativas.

Sem pretensões de ser exaustivo, aqui ficam as ideias principais da sua apresentação:

1 – Uma sala de aula diferente

Será necessário que a sala de aula onde o professor é o “sol”, onde o professor expõe e difunde o saber, se converta numa sala de aula espalhada, por onde o professor deambula e interage com equipas estáveis e orgânicas que procuram significado nas aprendizagens propostas.

2 – Sentimentos que nos interpelam

Sendo certo que a Escola deve ser exigente e trabalhosa, isso não significa que tenha que ser, forçosamente, aborrecida ou desinteressante. Importará, pois, apresentar os conhecimentos a adquirir, como algo que interpela ou motiva (que é significativo) para os que aprendem.

3 – Todos devem aprender tudo.

Em nome da democraticidade que se defende na escola e de forma a promover a igualdade de oportunidades entre todos, importa que todos possam aprender tudo. O que não significa (não pode significar!) que todos aprendam tudo do mesmo modo e ao mesmo tempo. Será necessário encontrar diferentes caminhos e diferentes ritmos para que todos possam chegar ao mesmo ponto de destino (independentemente do percurso que façam para o atingir).

4 – Uma forma diferente de ver o erro.

O erro, mais do que corrigido ou reprimido, pode ser entendido como uma oportunidade de aprendizagem. Mais do que identificar o que é que está mal, a escola ganhará se tentar perceber o que é que ainda importa aprender.

5 – Promoção de inter-relações entre os saberes.

Os conteúdos aprendidos são, frequentemente, descartados após a sua testagem, porque são vistos como informações isoladas. Importará cruzar saberes de forma a criar uma teia de conhecimentos que possa servir de alicerce a novas aprendizagens, com as quais se há de entretecer novamente.

6 – Liberdade de pensamento, de expressão e de questionamento.

Mais do que um repositório de “certezas”, a escola deverá promover a liberdade de pensamento (alternativo, inesperado, surpreendente), deverá incentivar a expressão (de opinião, de crenças, de convicções, de preferências ou gostos) e deverá premiar o questionamento e a dúvida.

7 – A prevalência das ideias sobre as grelhas.

Uma escola que se quer significativa, deverá ser uma escola que prefira trabalhar as ideias, a criatividade, a capacidade de descoberta ou de tentativa de descoberta, em detrimento de atividades que configurem a mera reprodução de saberes ou de informações.

8 – Multidimensionalidade

Como consequência do anteriormente enunciado, a escola (os professores) deverá privilegiar o trabalho e a avaliação multidimensional, ou seja, perceber que numa determinada tarefa, numa determinada aprendizagem, há muito mais aspetos a considerar (e a aprender) do que o simples resultado. No fundo, a diferença entre uma corrida de 100m (em que a única coisa que interessa é chegar à meta o mais depressa possível) e o passeio por um bosque (onde há uma infinidade de tarefas que se podem conseguir, algumas delas completamente imprevistas.

Terminada esta apresentação, foi a vez de tomar o palco o conhecido Jorge Serafim. 

Mais conhecido como humorista, Jorge Serafim revelou-se um comunicador extraordinário. De facto, este contador de estórias trouxe a Tomar, no seu “trolley” de viagem, muito mais do que piadas, boa disposição e gargalhadas. Na mala vinham livros, muitos livros, e muitas narrativas que fizeram rir, fizeram pensar e cavaram silêncios profundíssimos entre as paredes do Paraíso. 

Para quem pensava que era só um humorista… foi desconcertante, interpelador e muito, mas muito interessante.

A sua apresentação andou à volta dos livros, insistiu no papel de mediação que os professores precisam de ter, contou contos, falou de experiências pessoais, leu poemas, despertou a imaginação da “casa dos livros” e ensinou que quem conta uma história deve dizer “Era, era…” e quem a ouve deve responder “Era certo!”. E que só a Mahura sabia disso, quando todos pensavam que ela não sabia nada…

Fica a ecoar a história do cavaleiro que encontrou a morte no seu caminho e que aprendeu que mais do que a morte, é o medo e o silêncio que matam.

E não é possível esquecer essa revelação surpreendente de que o fiambre vem, afinal, da perna extra do porco! Seja ela qual for…

Foi, como se pode imaginar, uma apresentação absolutamente desconcertante e muito motivante.

Importará dizer ainda que a seguir se seguiu um almoço oferecido pela CMT aos professores que voluntariamente se inscreveram e que a tarde foi ocupada com atividades de carácter lúdico e cultural.



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