segunda-feira, 18 de maio de 2020

CoviDiário #12

Desabafo

Está escuro, não consigo ver, talvez por estar a dormir, ou apenas por estar com os olhos fechados. Deixo-me estar. Está quente e acolhedor, estou em paz, porque neste exato momento não tenho nenhuma preocupação, sou apenas eu e a minha almofada, por isso estou feliz.


De repente ouço um barulho irritante vindo do meu lado esquerdo, não vi exatamente o que era, apenas sei que parou. Pouco depois, volto a ouvir o barulho, mas, desta vez, vi que era o meu telemóvel: é hora de acordar para ir para a aula. Assim, contra a minha vontade, levanto-me, preparo-me e subo as escadas que vão dar ao sótão, pois é lá que está a minha secretária; estabeleço a conexão e ali fico, o dia todo, sozinha, só eu e o meu telemóvel.

Muitas vezes, torna-se aborrecido, secante, quase sufocante… acho tudo isto horrível, eu sei que é pelo nosso bem e pela nossa segurança, face às novas condições do dia a dia, e também para continuarmos a aprender para que, quando tudo isto acabar, estejamos ao nível de conhecimentos expectável para o nosso ano de escolaridade.

Sei que temos de ultrapassar todos os obstáculos que se atravessam à nossa frente, e isso é algo que normalmente faço sozinha, com um sorriso na cara, como se de nada se tratasse. Mas este novo obstáculo que estou a tentar ultrapassar não é apenas meu, mas sim do mundo inteiro, e é por isso que não o consigo superar com um sorriso na cara como aos outros, porque não depende só de mim, mas sim de todos.

Normalmente, quando algo não corre como eu queria, ou esperava que corresse, refugio-me nas coisas que me fazem esquecer das minhas responsabilidades, dos meus erros, dos meus defeitos, dos meu deveres, das minhas preocupações, que me fazem esquecer de tudo o que está à minha volta, fazendo-me entrar num mundo perfeito, mas que não existe, que é o meu telemóvel. Muitos acham que sou apenas viciada no YouTube ou que os ignoro quando estou no telemóvel, fazendo crer que sou uma má pessoa. Eu não sou uma má pessoa, na realidade, eu apenas me quero esquecer de tudo o que está a acontecer, seja isso bom ou mau.

Muitos usam a família e os amigos como um conforto, um abrigo, porque se sentem à vontade para falar de tudo com eles, mas eu não sou assim, nunca fui, eu não consigo nem gosto de falar com os outros sobre o que sinto ou sobre o que penso. Eu nem nas aulas consigo fazer perguntas ou afirmações, porque fico tão nervosa que quase sinto o meu coração a sair do meu corpo, sinto a minha cara a ficar quente, sinto o suor a cair, e sinto o tremer das minhas mãos; eu sempre fui assim e não sei se conseguirei mudar. Por isso é que esta fase da minha vida está a ser tão difícil, é uma fase da minha vida em que eu tenho de falar, de me expor, e, para me abrigar de tudo isso, de todos esses sentimentos, refugio-me no meu telemóvel. Por isso é que eu adoro dormir, porque ao fechar os olhos e adormecer nada do que se passa na minha vida me vem à cabeça, é como se estivesse no Paraíso. Por isso é que eu adoro a noite e a escuridão, porque é nesse momento que eu posso adormecer, mesmo sabendo que vou acordar outra vez, mas, naquele momento, estou feliz.

T24



Sem comentários:

Enviar um comentário