domingo, 12 de abril de 2020

CoviDiário #3

Esperança

4 de abril de 2020

É possível ver o medo no olhar. Medo do que acontece, mas especialmente medo do que ainda está para vir. Todos se calam, numa casa cheia, para atentamente ouvirem o que já é esperado. Anunciam-se mortes e mais mortes e o choque é tanto que se instala nessa casa cheia e barulhenta silêncio tanto que até a alma mais forte estremece. Suspiros e louvores a criaturas que o medo e a impotência nos levam a criar são as únicas coisas que interrompem o duradouro silêncio a que, para conter o pranto, somos obrigados.

Vão-se multiplicando as mensagens de esperança que nos chegam, mas multiplicam-se mais rapidamente o número de mortos. Correm as pessoas aos supermercados, para que em casa os mantimentos não escasseiem. Correm os dias e a única coisa que escasseia é a esperança. A nossa casa, antes refúgio, é agora calabouço. A nossa família, antes abrigo, é agora sinónimo de distância.

A devastação de todo o ocidente contrasta com a ostentação e opulência a que a nossa sociedade elitista estava habituada. Essa devastação assusta-nos a todos. A todos, menos a alguns tristes seres, que aproveitam estes cataclismos para alimentarem as campanhas de ódio que já vinham fazendo, mas esses já não são surpresa, até porque toda a gente já sabe que para um demagogo o medo e a indigência do povo são a melhor oportunidade de alcançar os seus objetivos. Apontam erros ao combate ao vírus, culpam governos pela destruição económica e dizem outros disparates e heresias que, com astúcia, cabem na perfeição no ouvido de qualquer Homem desesperado. Isto, para além das teorias da conspiração que atribuem todos os males deste mundo ao regime chinês e aos chineses (sem fazerem sequer qualquer distinção entre os mesmos). Teorias que o bom senso e a ciência desmentem, mas em que o ceticismo humano é tentado a acreditar e, assim, propagar o ódio e a discriminação de que este mundo já há muito padece.

É óbvio que nos dias que correm o foco de todos nós é o combate ao coronavírus, mas é importante não esquecer o vírus do populismo que se instalará nas sociedades ocidentais, aquando do desaparecimento da Covid -19, até porque esse vírus não há quarentena que previna. Por isso, peço esperança, peço coragem, peço que não tenhamos medo do futuro, até porque vai ficar tudo bem.

André Peixoto Pereira

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