domingo, 6 de março de 2022

A mulher no cinema

Eu sou uma mulher que tem o sonho de seguir a área cinematográfica, no futuro. Nunca como atriz, não! O meu jeito para atuar equivale a um redondo 0 (zero), mas há algo na possibilidade de poder contar histórias através de imagens que se movem, de criar personagens, cada uma com a sua personalidade e características diversas, de arquitetar mentalmente uma cena e, posteriormente, dar-lhe vida e trazê-la para a tela, que é absolutamente fascinante. Sempre tive a certeza de que isso me faria realmente feliz, mas a verdade sobre a indústria do cinema para a mulher é exaustiva e, francamente, indignante, sendo esta constantemente desvalorizada em cargos de direção, de realização, de cinematografia e de escrita de guiões. Tendo eu, como mulher, este desejo, a realidade é bastante dura e causa-me uma revolta interna inexplicável.

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Ora, se a mulher é uma minoria na indústria cinematográfica, isto leva a que personagens femininas em filmes realizados por homens sejam escritas com uma certa idealização de perspetiva masculina. É difícil para alguém que não uma mulher contar a sua história, o que resulta em personagens totalmente estereotipadas e que se reduzem a um “complemento” do protagonista masculino. Foi realizado um teste, denominado de Teste de Bechdel, que parece bastante simples na teoria, mas os resultados são impressionantes, e não pelo lado positivo. Este tem como objetivo avaliar a inclusão e representação de personagens femininas num filme, e apresenta três perguntas: O filme contém (pelo menos) duas personagens femininas? Essas personagens falam entre si? Tal conversa engloba tópicos que não sejam uma outra personagem masculina?; Infelizmente, o número de filmes (alguns considerados dos melhores e mais vistos) incapazes de responder afirmativamente a estas perguntas é chocante, o que se torna preocupante. Mulheres não são apenas adereços na vida de um homem; Mulheres têm tanto para contar ao mundo, histórias interessantes e detalhadas, têm características diferentes e, certamente, têm, entre si ou não, conversas que não englobem a menção de um homem. Mulheres são muito mais, e é isso que deveria ser representado em filmes, não uma “donzela em perigo” que precisa de ser salva, ou uma rapariga tímida que desperta o interesse do protagonista, ou até mesmo aparecer numa obra com o simples intuito de ser sexualizada. Mulheres são muito mais do que isso.

Como já mencionei, não é só em personagens que a mulher é desvalorizada nesta indústria. Eventos que celebram a excelência do cinema (com premiação) como os Óscares, Globos de Ouro, Directors Guild of America Awards e Critics’ Choice Awards, entre 2008 e 2022 (tremendamente recente, portanto), em 325 nomeações para diretores de filmes, 91,1% dos candidatos eram homens, sendo os restantes 8,9%, então, mulheres. Como se a situação não fosse já suficientemente grave, abordando agora outra repressão, apenas 3 diretoras femininas de origens raciais/étnicas sub-representadas receberam tal reconhecimento de prémios. Estes dados reportam-se apenas aos cargos de direção, porque em áreas como a cinematografia, por exemplo, e respetiva premiação, é ainda pior. Pode-se concluir que prémios que não sejam exclusivamente para um género (por exemplo, o prémio de melhor atriz/ator nos Óscares) têm um predomínio masculino, desvalorizando o trabalho de muitas mulheres que merecem todo o reconhecimento.

É triste que esta seja a atualidade que tantos acreditam ser progressiva quando, na verdade, é ainda uma realidade completamente desigual.

É inegável que o cinema tem um grande impacto na sociedade e na cultura e contribui para que estas sejam moldadas, e é por isto que estabelecer diversidade e igualdade de género na indústria é tão importante. Uma mulher tem uma perspetiva e experiências diferentes das do homem e ambas têm relevância, mas são necessárias mais histórias contadas por mulheres, tal como o reconhecimento de tais. Só uma mulher consegue descrever com total precisão o que é ser mulher e só esta tem o poder de mostrar, através de um filme, o quão maravilhoso é sê-lo, independentemente de tudo à sua volta e quaisquer dificuldades que tenha de ultrapassar. É fundamental mostrar às gerações futuras femininas que estas podem fazer o que quiserem e ser elas próprias, sempre. Todas deviam sentir-se representadas e ouvidas e há ainda um grande caminho a percorrer até a igualdade ser alcançada, mas nós conseguiremos. Porque nós somos mulheres.

Eva Garrucho

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