terça-feira, 1 de março de 2022

Um assunto de Mulheres e uma mesa com lugares vazios

Considero-me uma miúda cheia de sorte. Cresci a ouvir histórias de princesas guerreiras, de piratas que governavam os mares, de raparigas que escalavam montanhas, de rainhas, de cientistas… Personagens fictícias e reais que, embora não o percebesse na altura, representam tudo aquilo em que acredito. Cresci rodeada de pessoas que sempre me inspiraram. Cresci com a certeza de que podia ser o que quisesse, de que todos o podíamos fazer, desde que nos respeitássemos.

Ao longo de 10 anos, percebi que não existia aquilo que sempre assumi como garantido. Em terras e lugares não tão distantes, não havia rainhas, nem heroínas… A desinência “-a” desaparecia frequentemente entre negócios e interesses… Citando Virginia Wolf, “Durante a maior parte da história, anónimo era uma mulher”. Agora, vemos parte dela a perder-se novamente nas garras do medo e do abuso de poder. Em pleno século XXI, a educação não é um direito universal, a política continua a ser um mundo de homens, há pessoas sem controlo absoluto do seu próprio corpo, o mesmo corpo que é mais visto como sexual do que como arte, realizam-se práticas desumanas, associam-se géneros a coisas que não o têm, vários direitos humanos são violados e renegados… Por quanto mais tempo vamos tolerar isto?


Descendemos de uma longa e poderosa geração que nos deixou um legado, a nós, gerações vindouras, filhas e filhos de mulheres e homens carismáticos que lutaram para termos um lugar na mesa. Conseguiram reivindicar os nossos direitos. Agora, são nossos por nascença. São nossos por elas e por eles. Não será nosso dever usar a voz em prol do que estes nossos antepassados conquistaram e usá-la para defender aqueles que foram silenciados? Para que as próximas gerações não o tenham de fazer e para que se sentem à mesa, tal como fizemos…?

E, assim, hoje reforçamos a convicção de que o Feminismo não é um movimento exclusivo de mulheres. Independentemente das suas variantes democráticas, é um movimento heterogéneo e em constante evolução, político, filosófico e social que tem como objetivo alcançar a paridade de géneros através do empoderamento feminino e, especialmente, do reconhecimento desse poder (já existente) pela sociedade. O Feminismo inclui todos os géneros e sexualidades. Defende que todas as mulheres, de todas as cores, feitios e personalidades, sejam respeitadas por aquilo que são: seres humanos. No entanto, esta noção aparentemente radical tem vindo a ser mal interpretada. Mas, mesmo assim, como continuo a acreditar que são palavras e ideias que mudam o mundo, pergunto-me: afinal, o que é justo?

O ser Feminista é defender o direito da liberdade de escolha. Reserva a todas as mulheres a oportunidade de tomar decisões e de fazer escolhas que talvez não faríamos para nós. O feminismo tanto apoia mulheres cujo sonho é ser mãe, como outras que decidem abortar. O feminismo não subscreve o aborto, mas antes o poder de decisão. Sonha com um futuro em que as mulheres não têm poder absoluto, mas, sim, poder sobre si próprias. Um futuro com menos limitações e mais oportunidades.

O Feminismo não é uma luta entre géneros. Trata-se de, através da educação, reconhecer estereótipos e o sexismo enraizado na nossa sociedade, de modo a que, de forma inclusiva e inovadora, possamos evoluir juntos da melhor maneira possível.

O ser Feminista é sonhar com um futuro em que o movimento em si se torna irrelevante, por ter sido inteiramente concretizado. Um futuro onde não andamos a contar quantas líderes mulheres há em relação a homens. Se alguém ocupa esse cargo, é exclusivamente por mérito e não pelo seu género, cor ou sexo. Um futuro onde não há líderes femininos nem masculinos. Apenas líderes.

O Feminismo centra o holofote em temas adormecidos e casos perdidos entre as folhas do tempo, tal como vamos ver ao longo desta semana. É por eles que se quebra o silêncio. Hoje, a 1 de Março de 2022, começamos mais um ciclo: 6 temas, 18 histórias de mulheres inesquecíveis, várias mulheres portuguesas icónicas… Vamos viajar por entre décadas e pelo mundo em 8 dias, graças a uma equipa incrível de alunos e professores. 8 dias por 8 biliões de pessoas. O Feminismo é por e para todos.

Laura Ferros de Azevedo

Por fim, todos sonhamos com um mundo melhor, mas não basta sonhar. Há que escolher, abraçar e defender uma causa. Algo que desperte a nossa alma, ilumine o nosso olhar e dê força ao nosso coração, algo que esteja intrinsecamente ligado a nós. Afinal de contas, todos procuramos algo que faça o nosso sangue ferver. Tenho 17 anos e a vista toldada por uma imensidão de factos, opiniões, notícias e artigos que se convertem numa amálgama de pensamentos de acomodação e de aceitação… Ouço afirmações de que tudo é demasiado complexo para ser resolvido, mas, enquanto isso, surge em mim a necessidade de dar vida e sentido à corrente de sonhos, crenças, planos e memórias que mantêm coesa a essência desta convicção: a fé num futuro onde todos têm um lugar na mesa. Tenho 17 anos e muito por aprender, por ver e por perceber, mas de uma coisa tenho a certeza: isto não é um assunto (só) de mulheres.


Laura Ferros de Azevedo

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